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Tudo que você precisa saber sobre a 60ª Bienal de Veneza

A maior e mais antiga bienal de arte, sediada na cidade de Veneza, na Itália, começou. O evento, que vai até dia 24 de novembro, apresenta mais de 300 artistas sob o olhar do carioca Adriano Pedrosa, diretor artístico do MASP desde 2014. Pedrosa é o primeiro sul-americano convidado a assumir a curadoria geral da Bienal de Veneza, plataforma de 130 anos que proporciona visibilidade em escala internacional.


Foreigners Everywhere (2004-), de Claire Fontaine (Imagem: Divulgação/Claire Fontaine)


Nomeada Stranieri Ovunque – Foreigners Everywhere, a edição cita em seu título uma série de obras do coletivo Claire Fontaine, que leva, em diferentes línguas, a mensagem "Estrangeiros Em Todo Lugar" por meio de placas luminosas coloridas distribuídas em diversas localidades ao redor do mundo, em instituições culturais ou até mesmo ruas de cidades. Além da placa com os dizeres em português, localizada em Paris no Museu Nacional da História e Culturas da Imigração, há outras 52 placas – inclusive em línguas indígenas extintas. Todas as obras da série estão em exposição na Bienal.


"[...] Veneza: uma cidade cuja população original era constituída por refugiados das cidades romanas. [...] Devido ao enorme número de turistas e viajantes – estrangeiros de um tipo privilegiado – que visitam a cidade, em Veneza, os estrangeiros estão por todo o lado" (ADRIANO PEDROSA na carta de apresentação da Bienal)

O coletivo Claire Fontaine trabalha principalmente com palavras e objetos – retirando-os de seu sentido original e suas funções convencionais; reposicionando-os; e criando jogos a depender de como e onde essas frases e objetos estão apresentados. Ao nos depararmos com este jogo, fica a pergunta: o que são, afinal, estrangeiros? Como podemos definir o estrangeiro? Ou ainda, se estrangeiros estão por toda parte, o que não é estrangeiro?


A palavra traduzida como “estrangeiros” no original em italiano é, na verdade, Stranieri, ou seja, “estranhos”. Seguindo a etimologia da palavra, os termos “estranho” e “estrangeiro” possuem a mesma raiz, do latim “extra”, ou: o que vem de fora; o que não pertence a algo. No francês, Étranger ou Estrange. Ao passar para o inglês, Strange ou Stranger. Um outsider. O Foreigner (do latim Foris; de fora) possui a função fundamental de unir por completo o Estrangeiro ao Estranho, já que carrega dois significados na mesma palavra.


Em Foreigners Everywhere, o coletivo trabalha a ampliação do termo ou conceito de Estangeiro, uma brincadeira entre o que é Estrangeiro e o que é Estranho. Focar no que vem de fora, ou em quem está de fora. Aqui, colocamos em questão o estrangeiro não apenas como um refugiado, o imigrante ou aquele que vem de outro país. A 60ª edição da Bienal de Veneza traz como principal objetivo a ampliação de vozes estrangeiras (ou vozes estranhas), decoloniais, colocando em pauta a multiplicidade racial, cultural, religiosa, sexual e de gênero, etc.


"O foco principal da Bienalle Arte 2024 será, portanto, artistas estrangeiros, imigrantes, expatriados, diaspóricos, emigrados, exilados ou refugiados – particularmente aqueles que se moveram entre o Sul Global e o Norte Global" (ADRIANO PEDROSA)

Falamos aqui de um mundo globalizado, interconectado e muito diverso em uma exposição que se compromete a não só representar essas identidades e culturas "estranhas", mas mostrá-las a visitantes do mundo todo. O que são e quem são essas personalidades que estão, até o momento, "de fora"? Quais são seus enfrentamentos, problemáticas e realidades? O objetivo é refletir sobre o outro, entender sua origem, sua história e destino. O visitante é convidado a sair do que habita em si para conhecer aquilo que é estrangeiro, tudo o que vem de fora. Pedrosa, vindo de um país criado pela miscigenação e pela imigração, coloca o Brasil e uma periferia oculta no centro daquilo que é considerado um dos eventos mais importantes no setor das artes visuais contemporâneas. 


A Bienal é dividida em dois setores: o Nucleo Storico e o Nucleo Contemporaneo. O primeiro tem como proposta a apresentação de artistas da América Latina, África, Oriente Médio e Ásia que atuaram ao longo do século 20 cujas obras se enquadram no contexto do Modernismo, mas que permanecem, em sua grande maioria, praticamente desconhecidos. Este setor resgata, também, os cavaletes de vidro e concreto desenvolvidos por Lina Bo Bardi (1914-1992) para o MASP, prestando uma homenagem à arquiteta ítalo-brasileira. O núcleo é dividido em três salas: Diáspora Artística Italiana, Abstrações e Retratos (traduções nossas) – essa última trará obras de 112 artistas de diversos países.


"Estamos demasiado familiarizados com as histórias do modernismo na Europa, mas os modernismos do Sul Global permanecem em grande parte desconhecidos. O conhecimento sobre eles está limitado, na melhor das hipóteses, aos especialistas de cada país ou região, mas a ligação e a exposição conjunta destas obras será reveladora. É neste sentido que estas histórias assumem uma relevância verdadeiramente contemporânea – precisamos urgentemente aprender mais sobre e com elas" (ADRIANO PEDROSA)

O Nucleo Contemporaneo, por sua vez, é divido em duas partes: Ativismo Diaspórico e Desobediência de Gênero (traduções nossas), e apresenta obras produzidas entre 1975 e 2023 de 39 artistas e coletivos queers, marginais e/ou populares, além de uma abordagem e presença indígena forte. O pavilhão brasileiro (curadoria de Arissana Pataxó, Denilson Baniwa e Gustavo Caboco Wapichana), apresenta a mostra Ka'a Pûera: nós somos pássaros que andam. O nome faz menção a um pássaro que se camufla na natureza para se proteger de predadores. A curadoria reivindicou uma mudança importante no nome do pavilhão: agora é intitulado Hãhãwpuá, que significa 'território amplo' na língua Pataxó. A alteração surgiu da necessidade de considerar outras maneiras de identificar o Brasil, pela perspectiva de mais de 300 povos indígenas espalhados por todo o território nacional.


"Acho que é uma oportunidade de falar sobre como o estado brasileiro transformou populações indígenas inteiras em estrangeiros dentro do seu próprio território" (DENILSON BANIWA)

No total, são 332 nomes de artistas e coletivos – o maior número de participantes na Bienal de Veneza até então. A Revista Galérica apresenta, a seguir, alguns dos artistas presentes no evento:


Grupo MAHKU (Movimento dos Artistas Huni Kuin), Brasil. O coletivo do Acre pintou toda a fachada do salão central de exposições para a 60ª edição da Bienal de Veneza (Imagem: Divulgação/Jacopo Salvi)


Manto Tupinambá (2023), de Glicéria Tupinambá, Brasil


Jeffrey Gibson, artista natural do povo Choctaw-Cherokee, apresenta exposição individual no Pavilhão dos Estados Unidos (Imagem: Reprodução/Jessica Goehring)


Femme au Paon (s.d.), de Aly Ben Salem (1910-2001), Tunísia


Landscape (1922), de Armando Reverón (1889–1954), Venezuela


Conversation (1981), de Barrington Watson (1931-2016), Jamaica


El Año del Libertador (1950), de Bibi Zogbé (1890–1975), Líbano


Bordado (s.d.),  Bordadoras de Isla Negra (coletivo), Chile


I went away and forgot you (2017), de Dana Awartani, Palestina


Portrait Study with Headdress (1936), de Emiria Sunassa (1894-1964), Indonésia


A artista sul-africana Esther Mahlangu (Imagem: Reprodução/The Melrose Gallery)


Vilarejo com montanhas (s.d.), de Fulvio Pennacchi (1905-1992), Itália/Brasil


Dreams on the river (2011), de Güneş Terkol, Turquia


Flamenco dancers (2012), de Ibrahim El-Salahi, Sudão


Detalhe da exposição PAP ART (2023), de La Chola Poblete, Argentina


The et Sympathie (s.d.), de Lê Phổ (1907-2001), Vietnã


Série de esculturas de Leilah Babirye, Uganda


Detalhe da exposição Barzakh (2021-2022), de Lydia Ourahmane, Argélia


O Impossível (1945), de Maria Martins (1894-1973), Brasil


Ballarat, My Country (2020), de Marlene Gilson, Austrália


Tuakirikiri (2022), do coletivo Mataaho, Austrália


Milŋiyawuy 7 (2022), de Naminapu Maymuru-White, Austrália


L.A. Liberty (1992), de Pacita Abad (1946-2004), Filipinas


The Beating (2019), de Salman Toor, Paquistão


Exposição Exile Is a Hard Job (2019), de Nil Yalter, Egito

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